Ide, dizei a Pedro

É lamentável saber que cerca de noventa por cento dos presidiários são filhos de evangélicos (pessoas que frequentam ou já frequentaram igrejas evangélicas). Até nos presídios a ala evangélica tem que seguir um programa rígido para servir a Deus, sob pena de sofrer punições. Cerca de setenta por cento dos que fazem terapia com psicólogos e psiquiatras já passaram por igrejas evangélicas.

“Portanto, se, depois de terem escapado das contaminações do mundo mediante o conhecimento do Senhor e Salvador Jesus Cristo, se deixam enredar de novo e são vencidos, tornou-se o seu último estado pior que o primeiro. Pois melhor lhes fora nunca tivessem conhecido o caminho da justiça do que, após conhecê-lo, volverem para trás, apartando-se do santo mandamento que lhes fora dado. Com eles aconteceu o que diz certo adágio verdadeiro: O cão voltou ao seu próprio vômito; e: A porca lavada voltou a revolver-se no lamaçal” (2Pe 2.20-22). O que esse texto quer dizer? Muitas opiniões têm sido dadas, mas ele deve ser entendido.

É lamentável saber que cerca de noventa por cento dos presidiários são filhos de evangélicos (pessoas que frequentam ou já frequentaram igrejas evangélicas). Até nos presídios a ala evangélica tem que seguir um programa rígido para servir a Deus, sob pena de sofrer punições. E mais: cerca de setenta por cento dos que fazem terapia com psicólogos e psiquiatras, já passaram ou estão em igrejas evangélicas.

Tem alguma coisa errada com esse universo evangélico. Pertencer a alguma igreja evangélica não quer dizer nada quando se pensa em amar a Deus e ao próximo. A amizade dos crentes é apenas entre os iguais, entre os que pertencem ao mesmo grupo. O amor entre eles é apenas moral; pisou na bola, está fora do jogo dos interesses “espirituais”. O pastor que não agradar aos congregados é trocado por outro até que cansem dele para vir mais outro. O que dizem, não corresponde ao que são. É claro que para tudo isso que digo, existem exceções. Pena que não conheci essas exceções enquanto estive no meio deles por trinta e dois anos.

Alguém disse que “a igreja é o único exército no mundo que deixa os seus feridos para trás”. Essa é uma verdade nua e crua. Experimentei isso como pastor de igreja. A indiferença, o desprezo e a falsidade é o prato quente comido no dia a dia nesse meio. É forte o que digo, mas não estou julgando nem supondo nada; falo do que conheço. Não tenho nenhuma alegria em dizer isso, mas afirmo que muitos membros de igreja, incluindo líderes, precisam de uma real conversão a Jesus Cristo, sob pena de vegetarem dentro dos templos e morrerem esqueléticos espirituais por não terem vida com Deus.

Jesus veio ao mundo para buscar e salvar o perdido (Lc 19.10); ele não veio para julgar, ele veio para salvar (Jo 3.17). Ele veio dar vida abundante (Jo 10.10). Ele não veio esmagar a cana quebrada nem apagar o pavio que apenas fumaça. O nome de Jesus é sinônimo de esperança para todos indistintamente (Mt 12.20-21).

Pedro, talvez tenha sido o apóstolo mais paradoxal e extrovertido de Jesus. Quando uma pergunta era feita ao grupo, ele era o primeiro a responder. Ele dava respostas inspiradas, mas também era precipitado quando falava; extrapolava ousadia, mas também não conseguia esconder o medo; confrontou Jesus, mas também disse: “salva-me, Senhor!”; comeu com não-judeus o que o seu povo normalmente não comia, para em seguida dissimular que comeu; prometeu com veemência morrer com Jesus se necessário fosse, mas, negou três vezes seguidas para uma criada que o conhecia. Chegou mesmo a jurar e praguejar que desconhecia Jesus. Chorou amargamente por ter negado o Mestre, mas voltou ao estilo de vida anterior de pescador.

O que seria de Pedro hoje numa igreja evangélica? Como ele seria tratado por causa de seus erros mencionados nos evangelhos? Certamente ele seria excluído da membresia por bem menos do que fez de errado. A igreja evangélica é perita em excluir, e inexperiente em redimir. A “igreja dos excluídos” reunida formaria uma multidão para encher dezenas de estádios de futebol como o Maracanã. A igreja evangélica conseguiu criar uma cultura hipócrita em seu reduto. Não há ambiente para confissão sem punição. Daí, a omissão em confessar para ser curado (Tg 5.16). Apenas os omissos e cínicos são mantidos no rol; os membros que pecam e se expõem admitindo seus erros, são banidos do “arraial sagrado”. Jesus disse: “Os sãos não precisam de médico, e sim os doentes; não vim chamar justos, e sim pecadores” (Mc 2.17). A igreja deve ser uma comunidade terapêutica e não punidora; a igreja deveria ser o lugar mais seguro da terra para se conviver; infelizmente não é assim.

Davi cometeu adultério e ficou um tempo sem confessar. Veja o que ele disse: “Enquanto calei os meus pecados, envelheceram os meus ossos pelos meus constantes gemidos todo dia” (Sl 32.3). Agora, imagine pertencer a uma igreja evangélica ouvindo chamadas e desafios para viver em santidade, consagrar a vida para Deus, participar de campanhas intermináveis, vigílias, jejuns, dízimos, ofertas alçadas, e, tendo que lutar com um vício, uma mania, uma fraqueza, ou mesmo um pecado não confessado, por saber que a confissão ou o pedido de ajuda pode piorar as coisas. A pessoa surta ou fica cínica num ambiente onde “parece” que todos são irrepreensíveis e apenas ela tem falhas na vida.

Voltando ao apóstolo Pedro, o Evangelho nos mostra que o anjo que falou com as mulheres depois da ressurreição de Jesus, lhes disse: “Não vos atemorizeis; buscais a Jesus, o Nazareno, que foi crucificado; ele ressuscitou, não está mais aqui; vede o lugar onde o tinham posto. Mas ide, dizei a seus discípulos e a Pedro que ele vai adiante de vós para a Galiléia; lá o vereis, como ele vos disse” (Mc 16.6-7). O anjo pediu que as mulheres anunciassem a ressurreição de Jesus aos discípulos, mas com ênfase no nome de Pedro. Eu acho isso maravilhoso, pois, Pedro devia estar arrasado naqueles dias, se sentindo um verme, um traidor, covarde, falastrão, por ter negado Jesus. Agora, o Senhor manda dizer para ele que está vivo e quer conversar com ele e seus companheiros. Jesus foi ao encontro de Pedro na praia. Ele não jogou na cara dele sua traição, apenas pediu o seu amor por ele (Jo 21).

Fico emocionado enquanto escrevo, pensando em tanta gente sincera, mas enganada, que vive no meio evangélico e que não conhece a alegria de um perdoado (Sl 32.1-2). Quanta gente triste, culpada, surtada, decepcionada, que não consegue a “bênção” por fazer tão pouco para Deus. Por outro lado, quanta gente cínica, hipócrita, falsa, lobos vorazes, pousando de santinhos do Senhor, que exortam, consolam, ameaçam, fazem chantagem, paparicam, repreendem, ferem pessoas, são sepulcros caiados, e que parecem, mas não são o que parecem ser. Sei muito bem o que estou falando.

Jesus mandou dizer a Pedro que havia ressuscitado e queria ele de volta. Mas está dizendo também a cada um de nós que ele está vivo, cheio de graça. Não precisamos barganhar com Deus suas bênçãos porque elas são gratuitas. Ninguém precisa mais viver culpado, porque, “agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus” (Rm 8.1). Ninguém precisa viver de desempenho para agradar a Deus, porque o justo vive pela fé e não por obras (Rm 1.17; Ef 2.8-9). Ninguém precisa ser refém de nenhuma igreja evangélica para ser perdoado por Deus e ir para o céu. Saí de lá com minha família e estamos renovados, começando uma nova vida de verdadeira liberdade com Jesus, com os irmãos de nossa comunidade e as pessoas em geral com as quais cruzamos no dia a dia.

Antonio Francisco - Cuiabá, 21 de fevereiro de 2011 - Voltar para Mensagens.

Comentários

Anônimo disse…
São palavras pesadas para aqueles à quem a carapuça servir.
Lembro-me, nas escrituras Quando o próprio Jesus dizia aos religiosos palavras mais pesadas que essas.
Amém.
Estou esperando seu livro.rsrs
Obrigado Cesar pelo comentário.

Estou escrevendo o livro e gostaria de fazer noite de autógrafos no final deste ano.

Antonio Francisco.